Professor Evaldo Gomes
A Palavra transmitida e chamada
de Tradição é escrita aqui intencionalmente com maiúscula, para diferenciar-se
das populares "tradições" (com t minúsculo), ou seja, costumes de
origem desconhecida que se repetem pelos tempos afora. Tais "tradições"
podem ser boas ou más, podem ser alteradas ou até desaparecer. A Tradição da
Igreja, porém, originou-se de Jesus Cristo e dos apóstolos e se estendeu,
conduzida pelo Espírito Santo, por todos os séculos através da pregação e da
celebração dos mistérios de Cristo na Igreja. Essa Sagrada Tradição, que
devemos conservar, é mais ampla que a Sagrada Escritura, e não se opõe a ela
nem a contradiz, uma vez que se trata de uma mesma Tradição que se
"transmite" escrita ou oralmente.
Da mesma forma que a Igreja
primitiva precisou descobrir quais escritos eram autênticos e quais não eram,
ela também teve que reconhecer qual Tradição é verídica e qual não é. A Igreja
tinha diante de si, por exemplo, tradições opostas acerca dos livros que seriam
aceitos como Escritura Sagrada. Algumas tradições incluíam ou rejeitavam certos
livros, mas coube à Igreja distinguir quais livros são ou não canônicos. Para
decidir se tal livro era ou não Escritura Sagrada, a Igreja teve que optar por
determinada tradição. Assim, para estabelecer a autenticidade de um escrito, a
Igreja teve que estabelecer antes a autenticidade da tradição.
Como se vê, se a Igreja não é
assistida pelo Espírito Santo para reconhecer a verdadeira Tradição, então ela
também não foi assistida para reconhecer os escritos apostólicos, pois foi pelo
reconhecimento da verdadeira Tradição que a Igreja chegou até os verdadeiros
escritos. Nota-se, então, que uma coisa implica outra. Logo, existe a
verdadeira Tradição e a Igreja é a autêntica intérprete da legítima Tradição e
da legítima Escritura. Ou, então, nada é verdadeiro.
É muito significativo o fato de a
Igreja ter estabelecido o cânon mais de 300 anos depois dos apóstolos e ainda
mais baseando-se na Tradição. Ironicamente, os evangélicos - que tanto rejeitam
a Tradição em favor da exclusividade da Bíblia - eles mesmos usam uma Bíblia
berçada na Tradição.
Rejeitar a verdadeira Tradição
por causa da existência dessas tradições espúrias, levaría-nos a também
rejeitarmos a Escritura por causa da existência dos escritos apócrifos. Se tais
escritos não invalidam a verdadeira Escritura, por que a falsa tradição
invalidaria a autêntica Tradição? Logo, essa alegação não procede. Sabemos
que para reconhecer a verdadeira Tradição a Igreja seguiu o mesmo critério que
adotou para definir a canonicidade dos livros da Bíblia. Dentre outros itens,
dois foram os critérios básicos adotados pela Igreja primitiva para reconhecer
os autênticos escritos bem como a autêntica Tradição: a apostolicidade e a
universalidade. Se um livro era apostólico, ou seja, se fora transmitido
pelos apóstolos como Escritura (os livros do AT, p.ex) ou se foi escrito por um
dos apóstolos ou um de seus companheiros (os livros do NT, p.ex), então, era
considerado canônico.
Fonte: Programa
falando de Fé