Páginas

domingo, 8 de dezembro de 2013

A Tradição - I

Professor Evaldo Gomes

A palavra "Tradição" vem do latim "tradere" e significa "entregar". Tradição é, pois, no contexto aqui empregado, a transmissão ou entrega oral da mensagem cristã, compreendendo aí os ensinos dos apóstolos e dos primeiros cristãos transmitidos através dos Símbolos ou Profissões de fé, o Credo, através dos escritos dos Santos Padres da Igreja e dos ritos da Santa Liturgia. Toda essa mensagem foi primeiramente pregada ao povo e, só depois, foi escrita. Cristo mesmo nada escreveu; apenas pregou oralmente. Apesar de saber ler e escrever (Lc 4,16; Jo 8,6) Jesus anunciou sua mensagem apenas através da pregação, sem nada escrever e poucos dos apóstolos escreveram. Em outras palavras, Jesus e seus discípulos anunciaram o Evangelho predominantemente por via oral.

É facilmente perceptível que se o ensino escrito fosse realmente o exclusivo, Jesus e todos os apóstolos teriam tido primeiro a preocupação de escrever e depois pregar a Palavra oralmente. Mas aconteceu o contrário. Logo é impossível ser a Escritura a única regra de fé. É claro que se a Escritura fosse a única autoridade de fé, Jesus não deixaria de ele mesmo escrever sua doutrina. É claro também que todos os apóstolos escreveriam, não apenas alguns, como aconteceu. E ainda mais: acharia que Paulo escreveria cartas para pequenas comunidades em vez de escrever para todos os cristãos? A Escritura, então, não é, nem pode realmente ser a única regra de fé.

O argumento que cita o livro do Apocalipse para dizer que Cristo orientou os apóstolos a escreverem (1,11.19; 2,1.8.12.18; 3,1.7.14 ;21,5) não procede, pois, o fato de o Senhor orientar S. João para escrever um único livro, o Apocalipse, não desautoriza o nosso argumento, uma vez que durante toda a sua vida Ele nunca escreveu nem mandou nada escrever. Ora, se fosse obrigatória a escrita, com certeza Ele teria escrito ou pelo menos teria mandado os apóstolos escreverem, isso é lógico; mas isso Ele nunca fez. O fato de mandar S. João escrever o Apocalipse, não invalida, então, essa outra realidade. Por que ele não escreveu, nem mandou os apóstolos escreverem, mas, ao contrário, mandou-os pregar oralmente? Além disso, o fato de Ele ter mandado escrever paralelamente ao lado de mandar pregar oralmente, demonstra apenas a existência de duas autoridades: a autoridade oral da Igreja e a autoridade da escrita. Não justificaria, mesmo assim, a exclusividade das Escrituras.