D. José Cordeiro-Bispo de Bragança-Miranda.
Por Semana Santa entendem-se os últimos dias da Quaresma e o início do Tríduo Pascal. Esta Semana inicia-se com a procissão, que recorda a entrada messiânica de Jesus em Jerusalém, e com a missa em que se lê a paixão segundo um dos Evangelhos sinópticos.
Efetivamente, a celebração do inteiro mistério pascal de Cristo constitui o momento privilegiado do culto cristão, não só no seu desenvolvimento anual, mas quotidiano e semanal. O mistério pascal de Cristo é o princípio basilar de toda a reforma litúrgica: «a Santa Igreja celebra a memória sagrada da obra da salvação de Cristo, em dias determinados, ao longo do ano. Em cada semana, no dia a que foi dado o nome de “domingo”, comemora a Ressurreição do Senhor, que é celebrada também em cada ano, juntamente com a sua bem-aventurada Paixão, na grande solenidade da Páscoa»[1].Os primeiros testemunhos da celebração anual da Páscoa remontam à metade do século II e situam-se nas Igrejas da Ásia Menor. No Ocidente, os documentos sobre a celebração do Tríduo pascal são parcos nos primeiros quatro séculos. Todavia, Santo Ambrósio (+397) refere o termo “Triduum Sacrum” e Santo Agostinho (+430) usa, claramente, a expressão “Sacratissimum Triduum” para indicar os dias em que Cristo sofreu, repousou no sepulcro e ressuscitou, ou seja, «o Tríduo de Cristo crucificado, sepultado e ressuscitado». Por tal motivo, o Tríduo pascal não constitui uma preparação da solenidade da Páscoa, mas é, verdadeiramente, a celebração da morte e da Ressurreição de Cristo, da qual resplandece a novidade de vida em Cristo que brota da sua morte redentora.
Na verdade, a “teologia dos três dias”[2] comemora o mistério da cruz gloriosa de Cristo, o seu repouso no sepulcro e a sua Ressurreição, qual realização do desígnio salvífico. Estas celebrações são introduzidas pela Missa da Ceia do Senhor e atingem o seu momento culminante na Vigília pascal da noite santa. O Tríduo pascal da Paixão e da Ressurreição do Senhor, ponto culminante de todo o Ano litúrgico, inicia-se com a Missa da Ceia do Senhor, tem o seu centro na Vigília Pascal e termina com as Vésperas do Domingo da Ressurreição. No século VII já se conhece uma estrutura ritual da Vigília pascal constituída por três elementos fundamentais: a Palavra, o Batismo e a celebração eucarística.
O significado teológico dos três dias é realçado pelo Catecismo da Igreja Católica, nestes termos: «partindo do Tríduo pascal, como da sua fonte de luz, o tempo novo da Ressurreição enche todo o ano litúrgico da sua claridade. Ininterruptamente, dum lado e doutro desta fonte, o ano é transfigurado pela liturgia. É realmente “ano da graça do Senhor”»[3]. E, a seguir, acrescenta: «É por isso que a Páscoa não é simplesmente uma festa entre outras; é a “festa das festas”, “solenidade das solenidades”, tal como a Eucaristia é o sacramento dos sacramentos (o grande sacramento). Santo Atanásio chama-lhe “o grande Domingo”, tal como a semana santa é chamada no Oriente “a semana maior”»[4].
A festa da Páscoa do Senhor é o dia (Hodie) por excelência da passagem à vida nova, a festa das festas. A liturgia da Igreja que nasceu da Páscoa está inundada pela admiração, exultação e alegria, conforme os textos deste dia solene do ‘sacramento pascal’: «este é o dia que o Senhor fez: exultemos e cantemos de alegria»[5].
A Páscoa é, com efeito, o tempo festivo, no qual a Igreja é convidada a celebrar com mais solenidade a «Cristo, nossa Páscoa, que foi imolado. Ele é o Cordeiro de Deus que tirou o pecado do mundo: morrendo destruiu a morte e ressuscitando restaurou a vida»[6].
Os estudos atuais acerca do mistério pascal permitiram descobrir a íntima relação entre o dom do Espírito Santo, a Ressurreição e a Ascensão do Senhor. Por tal motivo, a Igreja celebra os cinquenta dias da Páscoa como “um grande Domingo”. A Ascensão do Senhor celebra-se no quadragésimo dia pascal ou se transfere para o Domingo seguinte, o VII Domingo da Páscoa. O Pentecostes celebra a plenitude da Páscoa: «Hoje manifestastes a plenitude do mistério pascal e sobre os filhos de adoção, unidos em comunhão admirável ao vosso Filho Unigénito, derramastes o Espírito Santo, que no princípio da Igreja nascente revelou o conhecimento de Deus a todos os povos da terra e uniu a diversidade das línguas na profissão duma só fé»[7].
A Igreja orante convida-nos, portanto, a cantar, na alegria do coração, o perene Aleluia em Cristo, nossa Páscoa.
+ José Cordeiro
[1] SAGRADA CONGREGAÇÃO DOS RITOS-CONSILIUM, «Normas gerais sobre o Ano litúrgico e o calendário 1», in EDREL, 130.
[2] Cf. H. VON BALTHASAR, Teologia dei tre giorni (Biblioteca di teologia contemporanea 61), Editrice Queriniana, Brescia 42000.
[3] Catecismo da Igreja Católica 1168.
[4] Catecismo da Igreja Católica 1168-1169.
[5] Sl 117.
[6] Missal Romano, Prefácio pascal I.
[7] Missal Romano, Prefácio de Pentecostes.
FONTE: Diocese de Bragança-Miranda/Portugal