Senhor,
Tende piedade deste pecador.
Sei que sou um ingrato.
Não sei se posso te chamar de Pai, por ser um filho tão indisciplinado.
Quantas e quantas vezes esqueço-me de conversar com Ti.
Quantas vezes Te abandono e largo-me em outras direções, como esquecesse de um guarda-chuva em um ônibus. E só me lembrarei de Ti durante a chuva.
Apesar de não seres um hospital corro para Ti ao primeiro sinal de dor.
Ao passar a dor sigo meu caminho sem olhar para trás.
E mesmo assim exijo Tua presença quando estou em apuros.Ao ser atendido acho que simplesmente Tu cumpristes com a obrigação de Pai. Quantas vezes lembrei de agradecê-Lo? Não sei, acho que muitas poucas vezes.
Mesmo assim Te condeno por permitir que sustos me ocorram. Te acuso de abandono quando tropeço e caio.
Muitas vezes deixo empoeirar tua Palavra, e, mesmo assim, quero que de mim nunca esqueças.
Quantas asneiras coloco em Tua santa boca, repito Teu santo nome em vão diariamente.
Entendi tudo errado. Sei que não és amuleto para me dar sorte. Nem um pronto-socorro.
Peço sinais de Tua existência, cego para a vida que me rodeia. Insensível aos sinais que pululam ao meu redor.
Meu coração quer repousar em Tuas mãos. Mas minha razão duvida a cada hora. Ou me amedronto.
Não consigo Te ver no nascer do sol.
Perdoa-me, Pai, mas não vejo o divino no meu acordar. Apenas vejo a rotina da vida, o acordar e o despertar.
Mas eu quero mudar, Senhor.
Quero ver Teus olhos. Mas o medo toma conta de mim.
Tenho medo de me encontrar com Tu, Senhor, por vergonha de meus pecados.
Receio repreensões por meus erros. Tu me negarás Tua mão. Logo Te evito.
Por isso, inconsciente, evito o encontro. Será isso?
Eu evito deixar o mundo me absorver.
Quero Te ver.
Quero te ver perto de mim, eu perto de Ti.
Quero deixar as escamas caírem de meus olhos.
Quero ver a Luz.
Disseram-me que Tu estás tão perto, tão perto... Mas tão perto que não consigo Te ver.
Estou surdo. Não consigo Te ouvir.
Não consigo ouvir sequer os cantos dos pássaros. Mas sei que eles cantam.
Nem Te toco, Senhor. Por que? Onde devo tocar?
Se estás tão perto por que não Te escuto, não Te vejo?
Onde procuro, Senhor?
Preciso, Senhor, interpretar Teus sinais.
Estou olhando para o céu durante todo o dia, mas não Te identifico. Pra onde devo olhar?
Muitas vezes abandono a procura. Às vezes entendo estar procurando o nada.
Mas retorno ao garimpo sem entender o que procuro.
Insisto, porque sinto que estás perto, mas me desespero porque não Te vejo, não Te escuto, não Te abraço, não Te beijo a face.
Sinto o Teu calor, imagino Tua presença; logo estás muito perto.
Fico imaginando onde estás.
Imagino estar louco porque, tantas vezes, achei que Tu eras aquela ave planando no alto. Ora, imagina. Um Deus gigante ser uma reles ave.
Como poderia Deus ser aquela humilde senhora na fila do hospital, implorando saúde?
Poderia Deus estar presente no sorriso de minha filha?
Como pode Deus estar tão perto de mim se tantas vezes O enxotei de minha vida?
Se já O larguei tanto, O despedi diariamente de meu ser, como Ele ainda está aqui, tão vizinho?
Como pode Ele ser tão eu, se O ignoro tanto?
Não. Ninguém me ama tanto a ponto de não desistir diante de tão grande indiferença.
Não acredito, Senhor, que Tu ainda estás aqui.
Serás que Tu és esta ponta de certeza na tão grande dúvida?
Tu és aquele raio de sol em meio a nuvens carregadas?
Ou o arco-íris na tarde de trovoadas?
És aquele abraço dos filhos após um dia decepcionante no trabalho?
Deve ser isto. Será que é?
Mas é muito simples. Se Deus é tão grandioso...
Sei lá. Será que ainda estás por perto? Tu ainda me aturas?
Será que ainda insistes em mim?