Autor:
Lélia Cristina de Melo – colunista da Gazeta do povo
A família não é uma entidade
meramente cultural ou ideológica, e, portanto, não é qualquer junção de pessoas
que deve ser considerada como tal. Qualquer junção de pessoas é uma dupla, um
grupo, ainda que estejam impregnados de um profundo afeto. Um profundo afeto
não é, isoladamente, justificativa para iniciar uma família. A família é
atemporal e subsiste aos séculos e às circunstâncias.
A adoção de crianças por pares do
mesmo sexo denota dois aspectos muito positivos: a tendência à
maternidade/paternidade inerente a toda pessoa, e a disposição dos homossexuais
para amar e educar crianças. Entretanto, para constituir família, só o amor não
basta. Ele não é o único critério, nem resulta suficiente por si só. Esta é uma
instituição social, pública, contínua e duradoura, bem como implica em prole.
A família proveniente de um homem e
uma mulher é o habitat mais natural dos filhos, sendo esta também a realidade
unívoca que impulsiona as gerações. Em sentido estrito, uma família começa no
ato conjugal de casais abertos a uma nova vida.
Para o desenvolvimento psicossexual
natural da criança e a formação da sua identidade, é necessária a presença dos
referenciais masculino e feminino. Sabe-se que a consciência do próprio gênero
é fator estruturante do psiquismo infantil; a indefinição neste aspecto afeta o
autoconceito, a autoestima e as interações sociais das crianças. Fazem parte
inexorável da infância a clareza das realidades e a pertencimento a um sexo ou
outro. Isso só é possível quando o núcleo familiar é constituído de casais
heterossexuais – posicionamento que, ressalto, em nada pretende desqualificar a
intocável dignidade dos homossexuais –, uma vez que a identidade sexual ocorre
através das representações psíquicas transmitidas pela intimidade familiar. É
essencial a presença das imagens paterna e materna, em que um progenitor sirva
de modelo de identificação, e o outro proponha à criança um modelo de
complementação.
Tendo em vista tais premissas, seria
injusto com a criança privá-la da convivência com as diferenças sexuais pelo
vínculo de pais heterossexuais. Segundo David Popenoe, crianças provindas de
famílias biparentais passam por estágios de desenvolvimento com mais
facilidade, são mais sólidas em sua identidade de gênero, desempenham melhor as
tarefas acadêmicas, têm menos distúrbios emocionais e tornam-se adultos melhor
preparados.
Desde Freud, passando pela teoria da
aprendizagem social e do desenvolvimento cognitivo, há unanimidade nos autores
quanto à formação da identidade sexual das crianças ocorrer com o progenitor do
gênero correspondente e, ainda que a composição familiar não seja um meio de
influência absoluto, é muitíssimo poderoso.
O Estado e a sociedade têm,
portanto, à sua frente uma nova seara com que se ocupar: o destino de
crianças que clamam por sua proteção e cuja legislação tem o dever de
assegurar, promover e proteger o bem comum e, acima de tudo, o bem integral dos
menores; afinal, toda criança tem, constitucionalmente, o direito inalienável
de ser acolhida e educada nas condições mais favoráveis possíveis.
Lélia
Cristina de Melo, psicóloga, é especialista em Neuropsicologia da Aprendizagem,
Desenvolvimento Pessoal e Familiar.